25.8.12

«Ao Mário Botas» de Augusto Oliveira Mendes

Os que apreciam o mar da Praia do Norte e olham para o Forno d'Orca como uma espécie de entrada para um mundo desconhecido, os que se perdem em observações e que criam, escrevem. No caso de Augusto Oliveira Mendes essa escrita tem uma intensidade tão forte quanto as ondas cafurnas que ele venerava. Deixou pouco escrito, a morte não lhe deu tempo. Sina dos maiores? Talvez. Os poemas sobre a praia e o Sítio e o Mário Botas são admiráveis.



No mar velhaco e atroz da Praia do Norte
a sereia chegou um dia ao areal
e dormiu -, diziam os mais velhos do Sítio

Aqui, lugar de santa e de suicídios
onde não chegam gaivotas nem sardinhas
as águas viraram-se para sapatear
toda a terra o homem


AO MÁRIO BOTAS

Inalado o cheiro das flores do campo
os gatos,
a morte moribunda, afastada
Poderias estar lá, Mário, nu, obrando
Perto um riacho ferido de espinhos, de mato
Os doces cobertos de seios e pimenta
seriam o repasto no feriado da lota
o desleixo perdido dos homens do mar

As gaivotas teriam partido rio acima
levando os pêlos quebrados da tua face



a noite embriagada
Augusto Oliveira Mendes
publicações o camelo e o cachimbo, Tramagal, 1990