19.10.18

Preso na Nazaré pela PIDE

Já foi cenário de romances, olhar de muitos poemas, mas a Nazaré, como cenário real, tem também muitas histórias por contar. Esta, por ex: no dia 28 de Agosto de 1960, Júlio Fogaça, comunista que disputou a liderança do Partido Comunista Português com Álvaro Cunhal, foi preso pela PIDE quando passeava na Nazaré. Júlio Fogaça foi suspenso pelo partido, logo a seguir. A explicação ainda hoje permanece um mistério.  Porque estaria na Nazaré? Que teria lá ido fazer?
As páginas da revista Visão (18 Out. 2018) dão conta da investigação que o jornalista Adelino Cunha revela no livro «Júlio de Melo Fogaça» que acaba de ser editado com «testemunhos inéditos de Domingos Abrantes, Edmundo Pedro e Carlos Brito ajudam a resgatar a intensa vida de um revolucionário esquecido.» A história já havia sido levantada no jornal Público, a propósito dos amores nas cadeias da polícia politica do regime fascista de Salazar e Caetano.

  Chegaram à vila da Nazaré perto das 13 horas.
  Deixaram os pertences no quarto que alugaram perto do elevador por 33 escudos e foram almoçar numa outra pensão. No domingo, compraram algumas recordações, duas pequenas jarras e uma caravela, mas quando caminhavam na direcção da garagem da empresa Ribatejana para regressarem a Lisboa, por volta das 16 horas, foram intempestivamente surpreendidos pela PIDE em plena calçada.
  Sílvio da Costa Mortágua, Manuel Lavado, Fernando Gaspar, Augusto Furtado Marques e José Ferreira Henrique Júnior prenderam Júlio de Melo Fogaça no dia 28 de Agosto de 1960. Estes agentes da PIDE prenderam assim um dos mais importantes (e ignorados) dirigentes comunistas portugueses do século xx.
  Como se explica o sucesso desta improvável emboscada policial, ao fim de 14 anos de perseguições falhadas, ainda que descontínuas? Uma operação de considerável envergadura no meio de uma vila que o Diário de Lisboa descrevia nesse mesmo dia como um destino de eleição dos turistas franceses, mas onde as estradas de acesso estavam profundamente degradadas e as automotoras da linha do Oeste nem sequer lá chegavam.
  A manobra da PIDE contou com acções simultâneas em Lisboa e cumpriu na plenitude o seu objectivo, ou seja, neutralizou, não apenas política mas também socialmente, um dos mais relevantes dirigentes do PCP em funções na década de 50.
  Os agentes da PIDE em momento algum hesitaram na identificação do alvo. 
  Sílvio Mortágua reconheceu facilmente Júlio Fogaça na Nazaré, «por saber que andava fugido à acção desta Polícia, por ser membro do comité central do chamado Partido Comunista Português e fazer parte da sua Comissão Política e do seu Secretariado». Levou-o para a esquadra da PSP local com a ajuda dos outros elementos da PIDE.

Júlio de Melo Fogaça
Adelino Cunha
Desassossego, 2018

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